sexta-feira, julho 16, 2004

Outra coisa

«Ahora quieren otra cosa. Los detectives son expertos en cocina mediterránea y filosofan sobre la lucha de clases. Antes los que filosofaban eran los sargentos de comisaría y los horteras de farmacia. Los jóvenes buscan emociones sofisticadas que yo soy incapaz de darles. Quieren novelas en las que los asesinos sean más inteligentes que los polícias, los ladrones más despiertos y com mejor suerte que las personas decentes y los sinvergüenzas más subyugantes que la gente honrada. Los malos son los buenos y los buenos, los tontos. Y desde que hay sociología, la culpa de los crímenes la tienen o la infancia atribulada o el medio hostil. En una palabra, el problema no reside en el Who’s done it? Todos creen que lo que determina el crimen es el campo de fuerzas que se crea alrededor de la víctima, la coacción al destino, que emana de ella, de su relación con los demás, ese sistema de fuerzas y probabilidades que rodea a toda criatura humana y que se suele llamar destino. Me sigues?»
 
 
Andrés Trapiello, Los amigos del crimen perfecto, Ediciones Destino, 2003

terça-feira, julho 06, 2004

Rendez-vous

O vulto chegou furtivo como só os vultos sabem. Bateu na porta, evitando o toque demasiado sonoro da campainha. Era esperado, pois nem um segundo passou antes da porta lhe permitir entrada na casa pouco iluminada. O vulgo levava consigo um pequeno saco negro. Agora que o descrevo vejo outro vulto nocturno como só os vultos sabem ser. Repete os gestos do anterior, acompanhado também por um semelhante saco negro, que brilha de tão opaco. Eis outro vulto, que coincide com mais outro, formando um elegante cortejo de encapuzados que, pelos gestos, não é grande risco afirmar como feminino.
A descrição passa doravante a ser mais justa. Um dos vultos que chegava apanhou-me distraído na observação e estou agora prisioneiro de um grupo que cresce, tumefacto, a cada minuto. A minha intuição masculina diz-me que algo de macabro se prepara. O cenário interior da casa cruza o perfume parado de um Museu de História Natural com a simplicidade higiénica de um hospital. Visto apenas as cordas com que me prenderam. Escrevo de cabeça estas palavras, para não me deixar tomar pelo medo. Assinalo as diferentes origens das mulheres, com predominância asiática, acho que tailandesa. Uma delas, talvez a dona da casa, dá início ao ritual exortando à abertura dos sacos negros, opacos e palpitantes. Em macabra coreografia, as mulheres que foram vultos retiram e colocam sobre uma mesa os pénis: tingidos de sangue, assustadores na sua tristeza inerte. Reparo no brilho das lâminas e desmaio.